A CRIANÇA COM FISSURA LABIAL E FENDA PALATINA NA ESCOLA

 

1. O que pode causar a fissura labial e a fenda palatina?

2. Como prevenir a fissura labial e fenda palatina:

3. Como é realizado o diagnóstico da fissura labial e a fenda palatina

4. Tratamento da fissura lábia e fenda palatina

5. Alimentação da criança com fissura labial e fenda palatina

6. A criança com fissura labial e fenda palatina na escola

 

Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) a cada 650 bebês brasileiros, um nasce com fissura lábio-palatal ou fissura lábio-palatina uma má formação congênita que pode ocorrer entre a 4ª e 12ª semana de gestação que provoca aberturas nos lábios e no céu da boca (palato), popularmente chamado de lábio leporino que é uma realidade em nosso país.

Seu diagnóstico pode ser realizado nos primeiros meses, porém não é muito preciso. Dependendo da posição do bebê no útero já dá para visualizar a fissura labial, entretanto, se for palatina (no céu da boca) é mais difícil, mas se o bebê tiver o lábio e o palato aberto é possível. Quando a fenda é apenas no palato fica mais difícil e o diagnóstico é feito apenas depois que a criança nasce. 

A fissura labial e a fenda palatina são malformações faciais que ocorrem durante o desenvolvimento embrionário. Elas podem aparecer separadamente ou com mais frequência juntas.

A fissura labial pode variar de uma pequena fissura no lábio superior a uma fenda completa estendendo-se para a base do nariz, podendo ser unilateral ou bilateral e a estrutura dentária pode ser deformada.

Na fenda palatina, o defeito de fechamento pode atingir todo o céu da boca e a base do nariz, comunicando diretamente um e outro. Pode ocorrer ainda, a úvula bífida (a campainha da garganta apresenta-se dividida) e comprometer a fala do paciente, o que é um dos estigmas do portador dessa anomalia.

Lembre-se que essas fissuras orais são somente uma malformação dos lábios que há correção e que não atrapalha na capacidade mental. Por isso, o indivíduo acometido deve ser tratado com respeito, carinho e compreensão, assim como qualquer outra pessoa.

As fendas orais são consideradas um problema de saúde pública pela OMS, em vista de sua prevalência, seu impacto biopsicossocial e necessidade de tratamento prolongado. Este não se resume à atenção especializada. Ele requer a articulação entre todos os profissionais da saúde, desde a atenção básica e média complexidade, visando a promoção da saúde, até a alta complexidade, para a reabilitação.

 

1. O que pode causar a fissura labial e a fenda palatina?

 

As fendas orais podem ser causadas por:

  • Fatores genéticos (genes ou cromossomos)
  • Teratógenos (por exemplo, consumo de álcool, uso de anticonvulsivantes, alguns antibióticos e antifúngicos durante a gestação)
  • Hereditariedade e fatores não genéticos (deficiências nutricionais, tabagismo, alterações metabólicas durante a gestação) compondo o que se conhece como mecanismo multifatorial.

Esta última causa é a responsável pela grande maioria dos casos de fendas não-sindrômicas enquanto genes, cromossomos e teratógenos, respondem pelos casos de fendas sindrômicas.

A etiologia das fendas orais é descrita como multifatorial, onde interações entre variantes genéticas e ambientais determinam o aparecimento da deformidade.

A hereditariedade desempenha importante papel para o surgimento da fissura. Se um dos pais tem fissura, a chance do filho aumenta em cinco vezes e se um filho tem a fissura a chance dos pais terem outro filho com fissura aumenta sete vezes.

A falta de ácido fólico na gravidez também está muito relacionada com o surgimento de fissuras.

 

2. Como prevenir a fissura labial e fenda palatina:

 

Atualmente as duas estratégias de prevenção são a educação da população para que evite situações de risco e o aconselhamento genético para famílias em que já existem pessoas com fenda oral.

As ações de educação em saúde são dirigidas a toda população, mas com ênfase para o grupo de mulheres em idade fértil.

Os objetivos principais são a identificação, o controle e a abstenção de situações e fatores que elevam o risco de aparecimento de fenda oral no bebê. 

 

3. Como é realizado o diagnóstico da fissura labial e a fenda palatina

 

 O diagnóstico é realizado através do exame de ultrassonografia que por volta da 15ª semana pode-se visualizar o nariz, lábios e palatos.

Com a utilização do ultrassom no pré-natal, aumentou significativamente o diagnóstico precoce das fissuras lábio-palatinas. Entretanto, o ultrassom tri dimensional permite uma visualização melhor do defeito, principalmente do palato. É muito comum que as fissuras orais não sejam aparentes ao nascimento.

A fenda palatina é menos óbvia que a fissura labial e pode não ser detectada imediatamente sem uma avaliação completa da boca. A fenda palatina é detectada por meio por exame visual da cavidade oral ou quando o examinador coloca um dedo enluvado diretamente no palato.

A gravidade da fenda palatina tem impacto direto na alimentação, pois haverá dificuldade de o lactente criar a sucção necessária para a sua alimentação.

É importante observar logo no período neonatal o momento em que a criança está sendo alimentada para corrigir eventuais erros, orientar manobras na alimentação e identificar as situações em que será necessário usar outros métodos e recursos para alimentar o bebê.

O enfermeiro pode orientar e esclarecer sobre a ordenha do leite, caso não seja possível aleitamento materno exclusivo (como ocorre na presença de fenda palatina).

Até o estabelecimento de uma estratégia eficiente de alimentação, recomenda-se fazer seguimento semanal com pediatra ou enfermeiro, monitorando rigorosamente o crescimento e desenvolvimento da criança. Em situações especiais, pode haver necessidade de intervenção nutricional por profissional especializado.

Depois que o bebê nasce, é feita uma avaliação clínica completa para identificar se há outros sinais e sintomas associados àquela fissura que podem estar associados a uma má formação cardíaca, por exemplo, ou a alguma síndrome de deformidade facial com outras implicações além das fendas.

A criança também pode apresentar otite e outras inflamações na tuba auditiva, que liga o ouvido à faringe, já que o mecanismo não funciona corretamente. 

 

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Diferentes formas de manifestação da fissura labial e fenda palatina

Fonte: Swiftyte

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Diferentes formas de manifestação da fissura labial e fenda palatina

Fonte: Lookfordiagnosis

 

4. Tratamento da fissura lábia e fenda palatina

 

O Tratamento da criança com fissura labial e/ou fenda palatina é cirúrgico e envolve os esforços de cooperação de uma equipe multidisciplinar.

O momento ideal para operar a fenda labial é entre três e seis meses, isso se o bebê estiver com um bom desenvolvimento, dentro do peso ideal e com boa condição clínica.

Já o palato é fechado entre 12 e 18 meses, quando a criança começa a articular as primeiras sílabas.

É muito importante ter em mente que todo o tratamento é baseado na higidez do paciente, que depende, fundamentalmente, da boa alimentação e da adesão dos responsáveis ao tratamento e que as cirurgias variam de acordo com o tipo (gravidade) da fissura.

A atuação do fonoaudiólogo também é de extrema importância e se inicia, praticamente, na maternidade, na orientação da alimentação às mães, seguindo com acompanhamento após a cirurgia do palato, com exercícios e principalmente na orientação dos responsáveis pelo estímulo a estes pacientes.

É importante que os pais recebam a orientação da importância da higiene oral desde o nascimento. A erupção dentária em pacientes fissurados segue a mesma cronologia de qualquer criança,

O uso de aparelhos no palato desde os primeiros meses de vida é controverso; pode ser indicado em alguns casos (há dificuldades como moldagem da criança e necessidade de troca do aparelho mensal devido ao crescimento).

Na consulta com os especialistas, (ortodontista, junto com o cirurgião) estes decidirão sobre a indicação de um aparelho antes da cirurgia inicial ou mesmo depois desta cirurgia,

O tratamento no consultório dentário não difere, de modo geral, de qualquer outro paciente: dentista; endodontia; periodontia são realizadas sem diferenciação.

Os objetivos no tratamento do paciente fissurado são focados para uma inserção do paciente no contexto social, educacional e profissional.

Para isso não basta a atuação de um profissional, ou mesmo de vários profissionais; o engajamento da família e o apoio dos responsáveis, para que atuem no tratamento são imprescindíveis.

O paciente, inicialmente, poderá ser estigmatizado, seja pela aparência, seja pela fala; mas os cuidados adequados pela família e equipe de saúde permitem ao portador dessa anomalia uma inserção social e uma boa qualidade de vida.

 

5. Alimentação da criança com fissura labial e fenda palatina

 

Os bebês que têm fissura lábio-palatal merecem uma atenção especial, principalmente na hora da alimentação.

Os bebês fissurados devem ser amamentados no peito com o leite materno e quando não for possível, este deve ser colocado na mamadeira.

Algumas orientações para a amamentação:

  • Os lábios devem juntar-se ao bico e à aréola para que a boca fique bem fechada e o leite não escorra. A pega da mama adequada favorece a compressão do mamilo pelos lábios do recém-nascido e, com isso, a ejeção  láctea da mama
  • O bebê deve ser ajudado a fazer a pega numa posição em que a mama possa vedar a fenda e impedir o escape de ar e de leite.
  • O bebê pode ficar sentado, de frente para o corpo da mãe. Como alternativa, a mãe pode deitar o bebê com a cabeça inclinada para o colo e inclinar seu próprio corpo sobre ele. Nesta posição, a ação da gravidade permite que o bico e a aréola penetrem com mais facilidade dentro da boca do bebê, – proporcionando maior vedação da fenda, melhor escoamento do alimento para a orofaringe e esôfago, reduzindo a fadiga e a energia gasta durante a mamada.

 

Os pais podem tentar uma variedade de mamadeiras antes de achar a que atenda melhor ao seu bebê. Este acompanhamento e orientações são realizados pela fonoaudióloga e o monitoramento do ganho de peso e de nutrição deve ser feito por pediatras. Inclusive, podem ser oferecidos alimentos pastosos (papinhas salgadas e de frutas) com a orientação e liberação do pediatra (Associação Brasileira de Fissuras Lábio Palatinas)

 

  • As mães que conseguem facilmente extrair o leite podem posicionar o bebê no colo, de forma que, por meio da extração manual, o leite seja diretamente ejetado na boca da criança.;
  • Essas posições ajudam o bebê a abocanhar o bico, impedindo o escape do alimento pela fenda que pode ser vedada pela própria mama. A mãe sempre pode auxiliar ocluindo a fenda com os dedos e apertar levemente as bochechas nas laterais que é um método que facilita o contato entre os lábios (ajuda a ocluir a fenda).

 

Confira um vídeo (em Espanhol) da Cleft Palate Foundation com recomendações para amamentação de crianças com fissura labial ou fenda palatina:

 

 

Para assistir outros vídeos sobre o assunto acesse a seção de vídeos da Cleft Palate Foundation aqui (em espanhol).

  • Observe se o leite está escapando para fora da boca. Caso isso aconteça, mude a posição do bebê para tentar melhorar a pega;
  • Observe sinais de cansaço do bebê durante a mamada (sono e poucas sucções). Isso pode trazer prejuízos nutricionais, pois a criança ingere menor quantidade de leite;
  • Controle o tempo de mamada que não deve ultrapassar 40 minutos (20 minutos em cada mama). Se o bebê permanecer mais tempo mamando, mas estiver ganhando peso, não precisa interferir. Entretanto, se a mamada for muito prolongada e mesmo assim o peso estiver abaixo do esperado, será necessário reavaliar a situação com profissional especializado (pediatra, enfermeiro ou fonoaudiólogo;
  • Oriente a mãe a oferecer as duas mamas. A postura do bebê pode variar de uma mama para outra. Ele também pode mamar melhor em uma que na outra, mesmo assim, oferecer ambas é importante;
  • É natural que o bebê demore alguns dias para aprimorar a sucção e se adaptar ao aleitamento materno nas mamas. A mãe deve ser orientada sobre isso para que não desista desse importante processo;
  • Quando o bebê não consegue ser amamentado no peito, existe a necessidade de utilizar as mamadeiras para oferecer leite materno ou fórmula láctea. Deve haver treinamento e acompanhamento das mães por profissional devidamente capacitado verificando os ajustes necessários ao longo do tempo.

 

Algumas orientações para a alimentação com mamadeira:

  • Colocar o bebê em posição semi-sentado durante a alimentação;
  • Tentar manter o bico imóvel dentro da boca para que o bebê consiga abocanhá-lo e para que se adapte mais facilmente;
  • Pressionar delicada e pausadamente o bico da mamadeira para facilitar o escoamento de leite. A alimentação efetiva pode exigir pressão no bico durante toda a mamada ou pressão a cada 2, 3 ou 5 sucções. Se o bebê mostrar sinais de cansaço as pressões no bico da mamadeira podem ser mais frequentes;
  • Interromper a mamada se o bebê mostrar sinais de cansaço e falta de controle do leite, não deglutição ou escape do leite pela boca. Após um breve descanso, recomece a alimentação.

 

Mais uma vez é preciso dar orientação aos pais de como receber e cuidar dessa criança, porque é tudo diferente, principalmente a alimentação. A posição do bebê durante a amamentação, o tempo e a frequência da mamada, todos esses fatores são diferentes. A fissura no céu da boca, por exemplo, faz com que entre mais ar do que o normal durante a mamada, então o bebê mama pouco, porque fica satisfeito rápido, mas logo tem fome de novo. O tempo da mamada é menor e a frequência é maior.

 

Ainda é comum entre as mães o mito de que bebês fissurados não podem ser amamentados. Amamentar bebês com fissuras, quando possível, é a melhor forma de estimular a musculatura da face, além de fortalecer o vínculo mãe-filho e evitar as infecções.

A mãe é a maior comprometida no tratamento do paciente. Na amamentação ela deve ser orientada que o tempo pode ser o dobro de uma criança sem fissura; que a criança pode regurgitar pelo nariz e que a posição da criança é fundamental para o sucesso da amamentação.

 

Acesse a cartilha: Alimentando o bebê com fissura labial ou fenda palatina (em espanhol)

 

 

Outras cartilhas da Cleft Palate Foundation aqui (em espanhol)

 

6. A criança com fissura labial e fenda palatina na escola

 

“A adaptação da criança na escola junto às outras crianças e o esforço para superar as alterações anatômicas e funcionais são acontecimentos que exigirão da família e da equipe multidisciplinar uma total solidariedade, para que tanto os pais como os filhos recebam de forma adequada, toda ajuda possível”.

As crianças portadoras de fendas orais, além de serem portadores de problemas estéticos e que podem causar problemas na socialização da criança; a dentição, audição, fala e a própria deglutição podem ser prejudicados e consequentemente ocorrerem possíveis situações de bullying as quais a criança terá de enfrentar (podendo ocorrer traumas emocionais sérios).

Em razão de sua complexidade e a necessidade de intervenções específicas de várias áreas médicas, o tratamento deverá ser feito por uma equipe multidisciplinar. Assim, quanto mais cedo fizer o tratamento, as chances da criança não passar por estes problemas são menores.

Mais informações sobre fissuras labiais e fenda palatina, além dos centros de referência acesse o site da Associação Brasileira de Fissuras Lábio Palatinas – ABFLP: http://www.abflp.com.br

 

 

Maira BassiMaíra Bassi Strufaldi

 Enfermeira e Fisioterapeuta, Pós-graduada em ortopedia e traumatologia, educadora em diabetes,   residente do HC-USP

 

Publicado em: 06/11/2016

Revisado em: 06/11/2016

 

 

Referências:

  • AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRICS. Cleft Lip and Palate: Parent FAQs. AAP, 2016.
  • BIBLIOTECA VIRTUAL EM SAÚDE.  Dicas em saúde. Fissura lábio palatal/lábio leporino. BVS. Acesso em: 23/10/2016.
  • CLEFT PALATE FOUNDATION. Neonatal Cleft Lip and Palate: Instructions for Newborn Nurseries. CPF, 2014. Acesso em 6/11/2016.
  • UNIVERSIDADE DE CAMPINAS. Manual de cuidados de saúde e alimentação da criança com fenda oral. Projeto crânio-face Brasil. UNICAMP, 2014. Acesso em: 25/10/2016.
  • MARTINS, J. Orientações aos pais de portadores de fissura lábio-palatal . Um olhar clínico. Monografia de conclusão do curso de especialização em motricidade oral. Itajaí, 2001. Acesso em: 26/10/2016.
  • MINHA VIDA. Lábio leporino: sintomas, tratamentos e causa. Disponível em: http://www.minhavida.com.br/saude/temas/labio-leporino Acesso em: 23/10/2016.
  • MINISTÉRIO DA SAÚDE. Blog da saúde. MS. Acesso em: 24/10/2016
  •  MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de atenção a saúde. MS. Acesso em: 24/10/2016
  • PREFEITURA DA CIDADE DE SÃO PAULO. Manual de cuidados básicos ao portador de fissura lábio palatina, Prefeitura de São Paulo. 2012. Acesso em: 24/11/2016.
  • WONG. Fundamento de Enfermagem Pediátrica, Marilyn J. Hockenberry; David Wilson, 9. Ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014.